Bem-vindos a mais Cinema na Varanda, a partir de hoje com algumas alterações, mas com o mesmo tipo de análise sobre cinema que os ouvintes estão habituados.
Filmes em pauta: Ataque dos Cães (Jane Campion), Amor, Sublime Amor (Steven Spielberg), Não Olhe para Cima (Adam Mckay) e A Filha Perdida (Maggie Gyllenhall).E mais: Cantinho do Ouvinte com os comentários sobre o episódio anterior. Bom Podcast!
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*Gravado no domingo, 30 de janeiro, via internet.
Olá varandeiros, que saudades tê-los de volta no meu spotify. Espero que estejam todos bem.
Gostaria de tecer alguns comentários sobre The Power of the Dog, que diferente de vocês, não consegui gostar tanto.
A Jane Campion para mim sempre foi uma diretora com habilidades incríveis no cinema. Um Anjo em Minha Mesa e o O Piano são filmes extraordinários para mim. No entanto, seus últimos projetos, na minha visão, perderam toda a espontaneidade e a leveza do início da sua carreira dela.
Foram cinco vezes as tentativas para adaptar a obra de Thomas Savage e nenhuma delas conseguiu sair do papel. Mas foi nas mãos de Jane Campion que o projeto pegou vida. Foi tão difícil adaptar esta obra justamente pela complexidade da trama e de seus personagens. São vários conflitos que fica difícil colocar tudo em tão pouco tempo. Além disso, todo o dialógo do livro é muito denso e preciso. Por conta disso, a diretora acabou utilizando várias locações com intuito de aprisionar aqueles personagens na vida mediocre que eles tem e assim traduzir esses sentimentos sem muitos diálogos.
Em Ataque dos Cães ela faz seu melhor filme desde O Piano, porém toda essa exaltação parece ser um pouco injustificável, justamente por conta da segunda parte. A primeira metade até é muito bem conduzida, mesmo apresentando elementos bastante tradicionais do gênero. Mas na segunda a diretora tenta complexificar e erotizar demais algumas situações (priorizando elipses, silêncios, olhares) que acabam diluindo todo o trabalho do Thomas Savage. Enquanto o autor é explicito nas intenções e na construção de cada personagem, Campion prefere a ambiguidade o que acaba prejudicando sua obra. No final, a impressão que fica é que essas incertezas não indicam o que de fato ela pretende com sua história.
[SPOILERS abaixo]
Um exemplo: Enquanto no livro, fica nítido que o personagem de Benedict Cumberbatch se transforma em cara bom com Kodi Smit-McPhee justamente para afrontar sua mãe e também cortejar o garoto. Mesmo sendo a todo momento um cara asqueroso. No filme, não temos muitas ideias sobre o motivo dele ter mudado tão drasticamente, na verdade parece que o personagem do Benedict tenha se apaixonou e, durante esse processo resolver ser menos machão e transformar em um cara melhor.
Sim, Campion consegue enriquecer o drama do personagem porém seu desfecho não consegue traduzir suas ideias. Sua morte cruel e lenta significa que um ser humano não pode regenerar? Que mesmo ele querendo melhorar, ele merece morrer de uma forma sofrida e triste? No livro, o assassinato é bem claro, já no filme parece uma vingança contra o personagem do Benedict. Para mim, ela deixa de fazer uma análise crucial da trama. Sobre o quanto o personagem do Benedict é um recalque de todas as suas frustrações e angústias. Uma vítima dessa masculinidade tóxica. Não estou dizendo que todas as suas maldades devem ser relevadas, no entanto se ele estava disposto a melhorar, seu final deveria ser menos amargo. O problema que no filme sua morte é vista como se fosse uma punição divina, quase biblica (nome do livro), como se aquilo fosse o destino do rapaz, enquanto na verdade toda a morte deveria ser construída para ser algo desgostoso ou uma crítica ferrenha a essa masculinidade tóxica.
Outro anacrônico problema é que nos anos 1960, época de publicação do livro, era justificável que o personagem do Benedict fosse entendido como um gay enrustido, mas simplificar as coisas a esse clichê em 2022 parece um redução bem mal feita, que não combina com a complexificação que Campion tenta colocar no seu filme. Enfim, a segunda parte é bem ruim.
Sobre as qualidades, todo o elenco está ótimo. Gosto menos da atuação de Smit-McPhee. Parece que em todo momento a diretora só quer explorar seu aspecto físico, esquisitão, muito esguio, desajeitado (na vida real, o ator sofre de uma síndrome autoimune que o faz ter problemas ósseos e nas juntas). Campion orientou o ator a não entregar muita coisa do personagem, então fica muito difícil entender suas motivações. Concordo que a fotografia do filme é deslumbrante, mas nem de longe a melhor dessa awards season, espero que não ganhe o oscar. Prefiro muito mais a de west side story ou de The Tragedy of Macbeth.
Textão, mas espero que gostem.
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Olá varandeiros, estava morrendo de saudades de vocês. Até resolvi comentar. Espero que meu comentário seja escolhido para o proximo podcast. Escrevi com muito amor. Tem até perguntas.
Sobre A Filha Perdida, fiquei bastante decepcionado com essa versão cinematográfica. Não estou dizendo que o filme não bom, mas que por conta de seu material base ser tão complexo e abstrato, essa adaptação acaba sendo bem precária. O livro é todo construído em cima da mente da Leda, suas contradições, suas percepções, memórias, ambivalências, quando isso é transporto para tela, fica tudo muito pouco palpável.
Mesmo assim, a diretora em seu primeiro filme, consegue, de forma louvável, produzir um obra coerente e fluida, mas esquece de toda preciosidade da escrita de Ferrante. O que torna todas as suas obras únicas são seus aspectos inesperados, seus espelhamentos entre os personagens e o elo materno/feminista que eles constroem conjuntamente. Tudo no longa é diluído. Os flashbacks são pavorosos e estão ali para justificar o abandono da Leda a suas filhas, uma interpretação completamente equivocada da obra. No livro, toda relação que a Leda tem com suas filhas são momentos específicos sobre maternidade ou também o convício entre mulheres ao longo de gerações.
Não entendi o porquê de mostrar flashbacks da Leda em Londres, não acrescentou nada ao filme e até no livro é uma parte completamente desnecessária. Além disso, a Jessie Buckley não me faz lembrar nada a Olivia Colman. No entanto, todas as interpretações conseguem prender o espectador.
Na minha opinião, o trabalho é satisfatório, mas como filme de início de carreira para a diretora, talvez seria mais razoável Gyllenhaal começar com um material menos complicado. Provavelmente, teria mais êxito.
Mas a fica uma pergunta para os varandeiros, certas obras literárias, realmente merecem uma adaptação para o cinema? Além disso, alguns livros são realmente inadaptáveis? ou toda adaptação é válida, mesmo fazendo alterações? Lembro que Vício Inerente e Ataque dos Cães foram obras que demoram anos para virarem filmes e, mesmo assim, alguns criticaram suas adaptações. Aquele cliché básico, ‘ O Livro sempre será melhor que o filme’.
Sobre Não Olhe Para Cima, um filme com muitas boas intenções, mas sem calibrar suas metáforas e críticas. Adam Mckay consegue fazer uma grande Sketch do SNL, lugar onde trabalhou por um bom tempo, mas faz tudo de forma muito rasa e americanizada.
Em nenhum momento do processo que impediria a destruição do meteoro, é criticado de forma direta, a forma social de produção que vivemos. Na verdade, ele se preocupa mais em fazer críticas aos politicos conservadores, negacionistas, grande imprensa, que no fundo é um subproduto desse sistema capitalista contemporâneo caótico. Como se o problema fosse a malvadeza de empresários e políticos, impedindo que se pense em uma alternativa organizada e disruptiva do sistema.
O filme deixou claro, no entanto, como o interesse privado sobressai a qualquer iniciativa de pensamento ao bem-estar público, o que de fato acontece na política econômica do mundo capitalista ocidental, liderado por gurus e ‘mentes brilhantes’ que são heroificadas aqui.
Achei interessante mostrar como algumas parcelas dos estadunidenses abraçam o negacionismo, fruto de uma ideologia profundamente ligada ao capitalismo neoliberal e sua valorização do sujeito ‘eu’ acima de tudo e de qualquer possibilidade de construção coletiva.
Sobre a metáfora do meteoro, ela é completamente imprecisa para discutir o aquecimento global. Para Mckay, o meteoro é facilmente resolvido com os avanços tecnológicos da humanidade, o que não ocorre com as Mudanças climáticas. Não há tecnologia suficiente para mudar a rota de aquecimento da terra. Não será com drones, armas nucleares, espaço naves e sim repensando e mudando a nossa forma de organização e produção social. Superando esse capitalismo predatório.
O filme também simplifica as relações entre países, no final parece que só EUA conseguiria resolver os problemas do mundo, praticamente nem existe diplomacia nessa realidade de Adam Mckay.
Mesmo assim, existem momentos bem engraçados, como o vídeo que defende a geração de empregos que o meteoro pode trazer ou toda a cena da Jennifer Lawrence e do Leonardo DiCaprio no programa da Cate Blanchett e do Tyler Perry.
Enfim, um filme ruim com momentos bons. Uma nova categoria para o Varanda Awards.
Abraços.
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